Programas
para análise de pockets, cavidades, túneis/canais e poros em proteínas
Para garantir maior proteção ao sítio ativo ou seletividade com relação ao substrato,
muitas enzimas possuem suas cavidades catalíticas profundamente escondidas,
acessíveis apenas por meio de túneis que conectam tais cavidades ao meio
externo. Outras proteínas, como as proteínas membranares, possuem como função
realizar o transporte de pequenas moléculas ou íons através de membranas, conduzindo-os até seu destino final por meio de canais. O estudo desses e outros tipos de espaços vazios podem ajudar na
elucidação dos mecanismos de atividade biológica ou acessibilidade às proteínas.
Softwares como Caver Analyst e Mole permitem que forma, tamanho, propriedades
físico-químicas e até a dinâmica de pockets, cavidades, túneis/canais, e poros (figura
1) possam ser analisados.
Figura 1. Tipos de espaços vazios existentes em
proteínas: A - pockets, B - cavidades, C - túneis/canais, D - poros.
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Definição
dos tipos de espaços vazios
- Pocket: depressão na superfície da proteína
que serve como sítio de ligação para ligantes ou outras biomoléculas.
- Cavidade: espaço vazio dentro de uma
proteína. Pode ocorrer de forma totalmente isolada ou não, possuindo
comunicação com o meio externo por meio de túneis/canais. Geralmente
constitui-se como o sítio ativo de uma enzima.
- Túneis/canais: espaço vazio que conecta
o meio externo ao interior de uma cavidade.
- Poros: canal que transpassa a proteína
de um ponto a outro, muito frequente em proteínas de membrana.
A seguir é apresentado
um tutorial em três etapas para mostrar como dar os primeiros passos na busca por
túneis e afins utilizando-se os softwares Caver Analyst (versão 1.0) e Mole
(versão 2.13.9.6). Como exemplo de aplicação, a estrutura utilizada será a
da enzima CYP1A P450 (código PDB: 4I8V), presente em mamíferos e
pertencente à subfamília das enzimas citocromo P450. Essas enzimas constituem
um grupo bastante grande e diverso de proteínas responsáveis por catalisar a
reação de oxidação de compostos endógenos e exógenos (estranhos à vida), geralmente
a partir de uma reação de monooxigenase. Estudo recente identificou um conjunto
de canais de acesso ao sítio ativo (quatro ao todo), os quais, por possuírem distintas características entre si, acabam influenciando diretamente na maneira da enzima controlar suas especificidades com relação a diferentes substratos.
Tutorial
- Mole
Por apresentar uma operacionalidade mais simples, opte por começar sua busca por espaços vazios a partir de Mole. Este
possui uma interface de interação bastante autoexplicativa (posicionando
o mouse sobre um parâmetro, surge na tela uma explicação sobre o
significado dele) e que ajuda o usuário já ir se familiarizando com a linguagem/nomenclatura
do assunto.
Mole também está disponível na internet. Este tutorial focará sua explicação no programa, mas
praticamente tudo o que será visto aqui pode ser feito da mesma forma no
servidor online. No entanto, além de você ter o Java instalado em seu
computador, as configurações de permissão dele devem ser modificadas. Do
contrário, problemas com relação à segurança do computador impedirão que o servidor
funcione corretamente. Em “Painel de Controle Java” e dentro da aba “Segurança”,
abaixe o nível de segurança para um inferior (médio). Se esta opção não estiver
disponível em seu computador, outra maneira de habilitar Mole consiste em
introduzir o site de seu servidor na lista de sites permitidos. Ainda na aba “Segurança”,
edite a seção “Lista de Exceções de Sites”, introduzindo o site em questão,
como mostra a figura 2.
Figura
2. Configurações do “Painel de Controle Java”.
Etapa 1:
Carregando uma estrutura
Ao abrir o programa, o
qual possui ícone de abertura dentro da pasta criada pelo processo de instalação,
a tela inicial (figura 3) oferece três possibilidades de escolha. Geralmente a
abertura de estruturas já processadas por outros programas ocorre com inúmeros
erros de segmentação, deformando-as. Portanto, pelo menos por
enquanto, opte por baixar a estrutura direto a partir do portal Protein Data
Bank. No lugar da opção sugerida pelo programa (1TQN), digite “4I8V” e clique
em “Download”.
Figura
3. Interface de abertura de Mole.
Na tela de visualização,
quatro cadeias aparecerão, conforme também indicado na primeira seção da aba “Refinement”,
denominada “Chains”. Por enquanto, trabalhe apenas com a cadeia “A”, desmarcando
as demais opções.
Etapa 2:
Localizando espaços vazios
Automaticamente, ao
carregar a estrutura, o programa já é capaz de detectar algumas cavidades. Ao
todo, só a cadeia “A” possui doze cavidades (além de mais nove cavidades internas) a partir
dos parâmetros iniciais sugeridos pelo programa na aba “Refinement”, à direita
na tela. Para detectar outras cavidades ou ainda mais tipos de espaços vazios,
um ajuste nos parâmetros é necessário. Experimente variar os parâmetros das
seções “Cavity Parameters” e “Tunel Parameters” de forma aleatória até achar os
espaços vazios de interesse. Resíduos na seção “Active Residues” também podem
ser marcados ou desmarcados para filtrar a pesquisa. A mudança de parâmetros
imediatamente inicia um novo processo de busca e os resultados aparecem em questão
de segundos na aba “Results”, logo abaixo.
Porém, uma maneira mais
eficiente de fazer isso é indicar um ponto de partida. Como já citado
anteriormente, a estrutura 4I8V possui ao todo quatro canais que permitem que
diferentes tipos de substratos adentrem a cavidade catalítica da enzima. De
acordo com a literatura, um desses túneis (saída entre as hélices E, F e I e a
folha beta-5) permite que moléculas de solvente consigam atingir a cavidade
catalítica de CYP1A P450. Ao tomar inicialmente um ponto entre alguns resíduos
convenientes (GLU 226, GLY 225, LEU 496, THR 497 e MET 498) em “Residues” da
seção “Specific Point/Residue(s)”, o túnel (também conhecido como túnel S) é
localizado, aparecendo na tela (destacado em laranja), como mostra a figura 4.
Figura
4. Resultado final do procedimento de procura de
túneis a partir de um ponto inicial.
Por fim, uma forma ainda mais
fácil de achar túneis seria a partir do próprio programa via um processo
automático. Ao clicar em “Auto” do grupo “Tunnels”, o programa é capaz de achar
automaticamente os túneis mais prováveis.
Etapa 3:
Analisando as propriedades
Após localizar os
túneis ou outros espaços vazios de interesse, chegou a hora de analisá‑los. A
partir da aba “Results”, ao lado de cada espaço vazio identificado, aparecem
informações que permitirão conhecê-los melhor. Clique em “Details” para ter
acesso a essas informações. Tomando o túnel S como exemplo, tal janela traz o
perfil do túnel, mostrando como o raio do mesmo varia ao longo de toda a sua
extensão. Clicando em “Lining and Properties” na mesma janela, diversas
propriedades físico-químicas do túnel são mostradas (hidrofobicidade,
polaridade, mutabilidade, etc.), sendo toda a informação detalhada entre os diversos
segmentos de resíduos que compõem o túnel.
A B
Figura
5. Janelas abertas a partir de “Details”, trazendo o
perfil de variação do raio do túnel S em função da distância (A) e as
propriedades físico-químicas do mesmo (B).
Um
pouco sobre Caver Analyst
Agora que você já tem
alguma noção de como achar túneis e afins, realizar o mesmo tipo de busca a
partir de Caver Analyst torna-se muito mais fácil. Ao contrário do que ocorre em Mole, uma estrutura já previamente processada em outro programa pode ser
aberta sem problemas. Caver Analyst possui abas específicas para computar
túneis e cavidades (poros ou pockets são exclusivos de Mole). A partir das abas
“Tunnel” e “Cavities”, janelas podem ser abertas para a escolha dos parâmetros de
busca. Alguns termos diferentes aparecem, mas são detalhados no manual do
programa (disponível nas referências abaixo).
O grande diferencial do
programa é que ele também pode efetuar busca por túneis ou cavidades a partir de
simulações de dinâmica molecular ou um conjunto menor de frames de uma
simulação. Dependendo da configuração de seu computador, o programa não é capaz
de abrir trajetórias muito grandes. Por isso, na dúvida, selecione um trecho
mais interessante de sua trajetória (contendo menos frames) para que o programa
possa funcionar de maneira mais rápida.
Ao contrário de Mole,
Caver Analyst não contabiliza propriedades físico-químicas, mas alguma análise
pode ser feita a partir da geração de gráficos que são capazes de mostrar como
diferentes aspectos variam ao longo da extensão do túnel. Uma opção
particular do programa são os mapas de calor (figura 6),
os quais mostram como o raio de um túnel varia ao longo de toda a extensão do mesmo durante uma trajetória.
Figura 6. Exemplo
de mapa de calor gerado em Caver Analyst.
Referências
1) URBAN, F.; TRUAN, G.; POMPON, D. Access channels to the buried active site control substrate specificityin CYP1A P450 enzymes. Biochimica et Biophysica Acta,
2014.
3)
MOLE 2.0 – USER MANUAL. 39 p.
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